Memórias em Tons Terrosos

 


Foto por Benjamin Cheng de Unsplash


     A casa da senhora na Rua da Serra não tem mais aparente a marca das cerdas do pincel na parede. O tom vinho parece desbotado ou talvez lavado de alguma chuva forte. 
     As janelas de madeira antiga são recém pintadas de verde escuro. Todos os veios da madeira estão preenchidos de tinta. É por isso que digo que a janelas foram pintadas recentemente. A roseira vermelha com rosas imensas parecem agradecidas pela chuva fina que caiu a noite. Eu amo caminhar depois da chuva. Principalmente de manhã. O ar está mais limpo e as cores, formas e sons límpidos e intensos, como se tudo a minha volta estivesse aproveitando a oportunidade de ser sem disfarce, camadas ou filtros. O ar sendo puro, o céu vasto e o vento esticando as nuvens, acariciando minha pele. 
     Uma abelha chega perto da maior rosa da roseira e faz seu trabalho. A cada segundo encarando a casa vinho e verde mais vida é adicionada a ela. Eu dou uns passos pra traz e atravesso a rua. Me sento no passeio e observo como um pássaro pousa no telhado. 
     A dona da casa abre a janela verde e vejo sua cortina branca balançando do lado de dentro. Vejo sua mão puxando a cortina e colocando parte dela pra fora. Tanto pequeno detalhe passando por cima de mim até que uma folhinha seca cai na ponta do meu nariz bem na hora que olho pra cima. Eu rio. Me fez lembrar o dia que coloquei a língua pra fora pra saber que gosto tinha a chuva e no meio do processo caiu uma folha na minha língua. Bem amarga. O que me fez lembrar das chuvas mansas de dezembro próximas dos dias de Natal. Enquanto a chuva caía no telhado de amianto, as luzes coloridas da árvore de natal me aqueciam o coração como as cores vinho e verde dessa casa na Rua da Serra.


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