Sereno





Aquela manhã, no campo verde, brilhante de sereno, a menina sardenta, ainda criança por dentro lutava para se equilibrar nas beiradas estreitas do campinho do bairro enquanto as outras crianças brincavam de pega a pega. Ouviam-se gritos e risadas altas, mas Ferrugem encontrava-se irrequieta em seu objetivo. Dar passo ante passo. Um após o outro. Frente a frente. Ponta de um pé com o calcanhar do outro. Sua concentração a silenciava. Seu silencio ensurdecia. Os ouvidos dilatavam. Sorriso fraco enganador. Seu peito inflava sentimento. Lacrimejava os olhos. A grama molhada ensinava a SER. O mundo encheu-se de significado. Ferrugem adorava a nostalgia. Sentia-se completa quando nostálgica; ao contrario de Alice que queria um mundo que fosse só seu em que “nada era o que é porque tudo era o que não é.”, Ferrugem queria as pequenezas dos seus espaços. Equilibrava-se na corda bamba do campo, molhando a meia branca, o tênis e a alma. Sentia vontade de sorrir e cantar. Tudo em silencio. As outras crianças faziam barulho demais e seu canto seria só mais um canto no meio de toda algazarra. A cada tentativa sentia-se flutuar e pensava: “Se der mais alguns sofridos passos, talvez algum dia chego a ser pássaro que voa alto, que vive”. Sua concentração era tanta que o tempo passou a não existir. E o sorriso a se alargar, amargo e doce. Contrastes que só um ser nostálgico pode conhecer. Respirou o ar gélido e puro. Quando seu silencio não bastou escutou-se um estalo e cabum! O silêncio alheio a atingiu em cheio. O campo estava vazio, ela estava sozinha com seu desafio e seu silêncio. Ela esteve sozinha o tempo todo.





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